015 | Lollapalooza no Brasil: de onde veio, onde está e para onde vai
Reflexões, memórias e perguntas sobre um dos meus festivais preferidos
No ano de 1991, Perry Farrell, então vocalista da banda Jane’s Addiction, teve uma ideia. Sua banda estava morrendo e ele decidiu fazer uma última turnê para comemorar esse feito. Só que não seriam meros shows em casas próprias para isso ou em teatros, mas sim um festival intinerante que percorreu várias cidades dos Estados Unidos. Estava ali criado o Lollapalooza, uma palavrinha de origem inglesa que está aí desde os anos 1890 para designar algo grandioso, incrível, inesperado, maluco.
Talvez o próprio vocalista não tinha noção do quanto o Lollapalooza viria ser uma força para caracterizar a música alternativa dos anos 1990. Bandas que seriam sinônimo do gênero musical - Nine Inch Nails, Cypress Hill, Pavement, A Tribe Called Quest, The Smashing Pumpkins, Soundgarden, Pearl Jam, Rage Against the Machine, Primus, Beastie Boys, Red Hot Chili Peppers, e por aí vai - marcaram uma geração inteira e começaram a transitar para terem uma visibilidade muito maior que jamais haviam pensado até então. A primeira parada do festival, em julho de 1991 no estado do Arizona, teve a cobertura da MTV, que afirmou que essa seria “a maior turnê do verão norte-americano” (recomendo ver o vídeo do link, é como voltar um pouco no tempo quando a MTV ainda era a MTV).
Com o passar dos anos o festival morreu em 1998, depois voltou de forma intinerante em 2003 e desde 2005 a edição “matriz” acontece em Chicago. Desde então falar de festivais de música no mundo é falar um pouco do Lollapalooza, inevitavelmente. Para além de ser parada obrigatória para as bandas consolidadas e um palco de descoberta dos novissimos artistas, o impacto financeiro é gigantesco: na última edição em agosto de 2024 estima-se que 440 milhões de dólares foram injetados na economia da cidade de Chicago. Todo ano há um frisson para saber quem vai estar no line-up. Nos anos 2010 o festival ousou se expandir e alcançar novos públicos em diferentes países e desde então temos edições do Lollapalooza na Argentina, na Alemanha, no Chile, na França, na Índia…e aqui também no nosso Brasil.
Falar do Lolla (vou referir ao Lollapalooza por Lolla daqui em diante, muito mais fácil) aqui no Brasil é sinônimo de falar na minha experiência indo em shows ao vivo. Meu primeiro show foi também meu primeiro festival: fui na edição de 2012, a primeira, ainda realizada no Jóckei Clube de São Paulo. Me lembro que na época eu tinha 15 anos e a banda da minha vida era Foo Fighters. Quando eu descobri que eles viriam para o Brasil eu devo ter enchido o saco dos meus pais de uma forma jamais vista para estar presente e ver aquele show. E deu certo; foi uma viagem cheia de aventuras e que resultou numa das experiências mais transformadoras da minha vida. Talvez eu conte melhor em Sabe aqueles eventos canônicos em que sua vida é totalmente transformada dali em diante? O Lolla Brasil 2012 foi um desses. Não sei se consigo agradecer suficiente meus pais por isso. Além disso fui em outras cinco edições: as de 2015, 2016, 2019, 2022 e 2023. Dá pra notar que o festival é muito importante para mim e tenho muitas memória felizes (e algumas tristes também) por conta dele.

Uma das coisas que me encanta em festivais de música é que eu me sinto conectado a uma comunidade de pessoas que curtem a mesma música que eu. Na primeira vez que eu fui eu era um moleque, não tinha tanta consciência disso, mas anos depois eu vejo que a galera alternativa era a minha galera que eu sempre quis fazer parte. As maquiagens, as roupas, o jeito de falar, as tatuagens…tudo estava ali escancarado. Era todo mundo esquisito. E eu que estava me descobrindo como esquisito me senti em casa. Ainda era num momento em que as redes sociais não eram o que são hoje, então tudo parecia ainda mais autêntico e verdadeiro. Estar ali era porque você era parte de algo muito maior. Você estava ali para curtir música, para estar com seus amigos, para suar, dançar, se divertir. Imagina então nos anos 90, quando você só se informava em grande parte por meio da TV e conversando com as pessoas? Era a sensação de estar seguro porque você estava em torno dos seus.
Desde a primeira edição até a mais recente que aconteceu não tem muito tempo, o Lolla Brasil já tem doze edições e olhar no que aconteceu em cada uma delas é fazer um exercício de retrospecto de como o mercado musical e o próprio festival foram se moldando a partir das mudanças comportamentais e de consumo de música. Pensando nisso, vou fazer dois pequenos exercícios. O primeiro deles vai ser de destrinchar cada edição do Lolla até aqui. Com isso vai ser possível ver com mais detalhes como o festival foi se modificando com o passar do tempo. A partir disso partirei para o segundo exercício: levantar algumas hipóteses sobre o atual momento do festival e o que podemos esperar dele para as próximas edições. 2026 está logo ali!
Lollapalooza Brasil 2012

O primeiro capítulo da história do Lolla no Brasil foi no Jóckei Clube de São Paulo e capitaneou um line-up muito interessante para o que vinha aparecendo no Brasil na época. No primeiro dia teve Foo Fighters estouradaço à epoca com o lançamento de Wasting Light e no segundo dia teve um Arctic Monkeys que estava começando a dar sinais de que seria a próxima grandiosa banda a nível de arrastar multidões mundo afora em um momento pré-AM, o clássico de 2013. Uma coisa que o Lolla sempre foi bom foi de trazer queridinhos da música alternativa internacional que estavam bombando, como MGMT, Friendly Fires, Gogol Bordello e TV On the Radio; ao mesmo tempo traziam para o Brasil pela primeira vez uma galera como Joan Jett and the Blackhearts, Cage the Elephant, Foster the People e Band of Horses. Jane’s Addiction no segundo dia carimbou a presença de um veterano que vinha desde as edições clássicas dos anos 90. Como disse ali em cima, eu fui no primeiro dia para ver o Foo Fighters e foi um lindo dia ensolarado ao meio de gente esquisita e bosta de cavalo.
Lollapalooza Brasil 2013

Me lembro de estar na escola e falar com uma colega de sala que esse Lolla estava imperdível e de fato eu acho que foi imperdível. Eu não fui, mas todo mundo que está beirando os trinta anos como eu fala com muito carinho dessa edição. E eu entendo o porquê: teve três dias, o que significa muito mais bandas e artistas para ver. Teve bandas gigantescas e muito queridas no cartaz, como Pearl Jam, The Killers e Queens of the Stone Age; teve gente que veio e desde então nunca mais voltou, vide Cake, The Black Keys e The Flaming Lips; teve bandas que tem muito carinho com o Brasil como The Hives, Kaiser Chiefs e Franz Ferdinand. Atrações brasileiras estavam começando a alcançar cada vez mais espaço no line-up, como Planet Hemp e Criolo mais em cima e Vanguart, Vivendo do Ócio, Wannabe Jalva e Eddie um pouquinho mais embaixo, dentre outras. Teve até dobradinha de Maynard James Keenan, vocalista prolífero e que comandou duas de suas três bandas, A Perfect Circle e Puscifer. A terceira só estrearia em solo brasileiro muuuuuuitos anos depois (caso não saiba qual é, pule para os meus comentários sobre a edição de 2025).
Lollapalooza Brasil 2014

Esse foi uma edição muito emblemática por muitos motivos. O primeiro e maior deles sendo, naturalmente, a mudança de local do festival. Agora no Autódromo de Interlagos havia mais espaço para os diferentes palcos, ativações e afins. Infelizmente só trocamos a lama no sapato de um local para outro. Outro destaque foi que além de manter apenas dois dias de festival, 2014 marcou o primeiro ano de realização do festival na Argentina. Lá e no Chile eles contaram com shows do Red Hot Chili Peppers, enquanto aqui tivemos Muse. As outras três atrações principais na forma de Soundgarden, Nine Inch Nails e Arcade Fire seguiram padrão nos três países. Alternativos internacionais de alta estirpe como Pixies, Phoenix, Vampire Weekend, Johnny Marr, Savages e New Order abrilhantaram o line-up. Me lembro de ver o show do Julian Casablancas solo (sem The Strokes e sem The Voidz) pela televisão e ter achado muito estranhíssimo. E você se lembra da última vez que viu a Lorde em um lugarzinho tão pequeno do line-up de qualquer festival internacional? Provavelmente foi aqui.
Lollapalooza Brasil 2015
Essa edição aqui me fez pisar em Interlagos pela primeira vez por conta de um guitarrista meio maluquinho chamado Jack White no primeiro dia. Foi meio mágico adentrar aquele lugar pela primeira vez e sentir todas as dores do corpo ao subir a ladeira da estação Autódromo da CPTM pela primeira vez (e descer já de noite, todo esgotado). A curadoria trouxe também Robert Plant (o sempre magnífico ex-vocalista de uma tal de Led Zeppelin, já ouviu falar?), The Smashing Pumpkins, Foster the People no topo; e notem que cada vez mais o pop, o rap e a música eletrônica começavam a tomar de conta do festival com as aparições de Pharell Williams, Skrillex e Calvin Harris de forma mais significativa no topo. Esse festival marcou também uma tendência triste que os Lollas da América Latina encarariam com maior frequência com o passar dos anos: o cancelamento de artistas e bandas, muitas vezes em cima da hora. Quem lembra do show de Marina and the Diamonds no Brasil que não rolou porque ela perdeu o vôo?
Lollapalooza Brasil 2016

Esse aqui eu também fui e foi o Lolla mais insano até aqui, partindo da minha experiência pessoal. Tinha muita coisa interessante, de Cold War Kids a Of Monsters and Men, de Alabama Shakes a Jack Ü (com aquela participação fantástica do MC Binn). Fui só no primeiro dia, e nele vivi um Eagles of Death Metal em alta com os tristes eventos do atentado terrorista em Paris no ano anterior; comer um yakissoba vendo Bad Religion nos morrinhos de Interlagos, um furto de celular pós show fantástico do Tame Impala hypado na turnê do excelente álbum “Currents”, depressão na muvuca do Die Antwoord (pelo celular que se foi) e Marina and the Diamonds num show de Pop alternativo com P maíusculo na época em que o “Froot” era o álbum do momento. Realmente, Lolla: ninguém volta o mesmo. E olha que curioso um Twenty One Pilots tão minúsculo ali nas linhas. Será se alguém imaginava que seriam headliners tão gigantescos anos depois?
Lollapalooza Brasil 2017

Essa aqui é uma das edições que eu menos tenho memória ou emoção vinculada. Não é nem porque eu não fui, mas também porque à epoca nada do line-up não me interessava tanto, vi pouco até das transmissões. Não dava o devido valor para muita coisa que estava ali no cartaz, acredita? Hoje vejo que eu me divertiria horrores indo. Metallica na turnê mundial do álbum “Hardwired…to Self Destruct”. The XX, atração arriscada mas que entregou um show lindo na época do “I See You”. The Weeknd na era “Starboy” fazendo um show pra deixar os mamilos durinhos. E The Strokes…bom, eles sempre foram uma loteria ao vivo, ou você vai ter o show da sua vida ou você vai ver cinco novaiorquinos completamente desinteressados no palco. O resultado fica a critério de quem viu ao vivo. Rancid, Two Door Cinema Club, Jimmy Eat World, Catfish and the Bottlemen e Cage the Elephant representando bandas de rock nas demais linhas, Glass Animals, MØ, Tove Lo e Tegan and Sara num lado mais pop. Criolo, Jaloo, Céu Baianasystem e outros representando a música nacional…ainda que nada espetacular, consigo ver como um line-up bem sólido. E ainda teve Duran Duran como atração para aplacar festivaleiros de todas as gerações, especialmente aos pais que foram acompanhar os filhos no festival.
Lollapalooza Brasil 2018

Esse aqui eu choro até hoje por não ter conseguido ir. Assim como o Lolla Brasil de 2013 que falei lá em cima, esse é dito por muitos como uma das melhores edições do festival no Brasil - senão a melhor. Primeiro por inaugurar uma tendência que viria para as próximas edições aqui e nos vizinhos Argentina e Chile: três dias de festival. Segundo que a curadoria conseguiu aproveitar muito das turnês internacionais que estavam rolando e trouxeram nomes de peso. Red Hot Chili Peppers, Pearl Jam, The National, The Killers e Liam Gallagher de atrações principais para os roqueiros, Lana Del Rey e Imagine Dragons para os mais direcionados ao pop. Hip hop, R&B e rap muito bem representados por Mano Brown, Chance the Rapper, Wiz Khalifa, Khalid, Anderson Paak. and the Free Nationals, Mac Miller, Liniker & os Caramelows, Mahmundi e Rincon Sapiência. E muuuuuitas atrações alternativas interessantes espalhadas ao longo do fim de semana, incluindo David Byrne (gênio-maluquinho e um quarto do lendário Talking Heads), LCD Soundystem, Mac DeMarco, The Neighbourhood, Metronomy, Sofi Tukker, Spoon. E a música nacional representada muito bem por O Terno, Selvagens à Procura de Lei, Francisco El Hombre, Braza, Ventre, Tagore, Tiê, Mallu Magalhães…entende o porquê até hoje eu choro pelo que eu não vivi?
Lollapalooza Brasil 2019

Esse Lolla tem uma história engraçada para mim, pois eu o vi na faixa por ter ganhado uma promoção da Doritos no falecido site Twitter. Eu e um amigo fomos na sexta do festival com tudo pago. Translado até o aeroporto, hospedagem, passagem de avião e pulseirinha pro VIP da ativação do salgadinho. Um dia eu conto essa história melhor. Enfim: esse Lolla fez barulho por algumas razões. A primeira delas foi incluir Tribalistas, um dos maiores gigantes da música popular brasileira recente, como atração principal. Torceu alguns narizes, mas Carlinhos Brown, Marisa Monte e Arnaldo Antunes fizeram um show fantástico. Estava lá, pude atestar. Arctic Monkeys na época do divisivo “Tranquility Base Hotel & Casino”, Kendrick Lamar surfando na alta na época do “DAMN.” e um Twenty One Pilots que cresceu demais a ponto de eu assistir a transmissão em casa e não conseguir ouvir Tyler e Josh porque o festival INTEIRO estava cantando. Kings of Leon foi atração exclusiva da edição brasileira e Lenny Kravitz, Sam Smith e Post Malone fecharam as atrações principais. Outros nomes de destaque foram St. Vincent, Foals, The 1975, Troye Sivan, a banda de metal brasileira Bring Me the Horizon, Jorja Smith, Greta Van Fleet e Years & Years. Brasil abrilhantando com Autoramas, Molho Negro, E A Terra Nunca Me Pareceu Tão Distante, Luiza Lian, Letrux, Carne Doce, Liniker & os Caramelows, Gabriel O Pensador, Duda Beat e tantos outros. Baita edição.
Lollapalooza Brasil 2020

O festival que nunca foi. A não ser que você estivesse morando debaixo de uma pedra nos últimos anos, deve ter ficado sabendo que o mundo foi aplacado pela pandemia de COVID-19 e isso fez com que turnês e festivais fossem canceladas por todo o mundo por um bom tempo. Uma pena que por isso o Lolla Brasil teve de ser cancelado, e em especifico essa edição que traria muita coisa incrível. O festival voltaria dois anos depois, como veremos a seguir, mas muita coisa que rolaria em 2020 não aconteceu depois: BROCKHAMPTON (que hoje em dia nem existe mais, tristeza), Travis Scott, Lana del Rey, James Blake, Gwen Stefani, Vampire Weekend, The Lumineers, Red Orange County, Rita Ora, Kacey Musgraves, Charli XCX, King Princess, Denzel Curry, Hayley Kiyoko… Teria sido uma edição muito sólida e com muitas atrações de peso. Ah, e ia ter o Guns ‘n Roses também.
Lollapalooza Brasil 2022

A vida aconteceu, a gente seguiu em frente e após dois anos o Lolla Brasil voltou para todos nós. No mesmo lugar, três dias, tudo bonitinho. Eu, que havia comprado ingresso para três dias em 2020, estava animado e vacinado para retornar a Interlagos para curtir. Algumas atrações que deveriam ter vindo continuaram no cartaz, como The Strokes, LP, A Day to Remember e Martin Garrix. Outras vieram como novidades, como Turnstile, A$AP Rocky, Doja Cat, Kaytranada, Alessia Cara, MARINA (sem o “The Diamonds” agora), Black Pumas e The Libertines (que foram exclusivos do Brasil) Porém esta deve ter sido a edição mais caótica de todos os tempos do festival no Brasil. Explico: a baixa do Foo Fighters no cartaz após a trágica morte do baterista Taylor Hawkins na Colômbia dias antes. Para além disso, Jane’s Addiction, Phoebe Bridgers e King Gizzard & The Lizard Wizard saíram após as vendas de ingresso começarem e deixaram alguns fãs chupando dedo. No entanto o que efetivamente aconteceu foi memorável: um show do The Strokes em que eles realmente pareciam estar se importando em estar ali, Miley Cyrus sendo A diva pop do festival em um show emocionado e emocionante e IDLES fez um dos set mais catárticos da minha vida. Foi meio traumático mas foi divertido.
Lollapalooza Brasil 2023

Era de se esperar que após um ano bem conturbado o Lolla tivesse uma edição um pouco mais tranquila, certo? Bom, mais ou menos. O fantasma do cancelamento de artistas atingiu forte essa edição: Blink-182, talvez a atração mais desejada em muito tempo de festival, cancelou a participação aqui e nos países vizinhos após o baterista Travis Barker quebrar um ossinho de uma das mãos. Foram substituidos pelo Twenty One Pilots, agora já duo-banda gigantesca, que fizeram um show de respeito. O meio rapper meio fanfarrão Drake também cancelou em cima da hora e teve como substituto o DJ Skrillex. Outras atrações também acabaram cancelando, fazendo com que o festival tivesse que rebolar para poder continuar mantendo o público engajado e interessado. Billie Eilish e Lil Nas X estrearam no Brasil com força, Tame Impala fez um Show com “S” maiúsculo mesmo com Kevin Parker estar todo quebrado (chupa, Travis!) e Rosalía mostrou porquê era a maior potência do pop alternativo à epoca. Kali Uchis, The Rose, Rise Against, Yungblud, Modest Mouse, Jamie XX, The 1975, Jane’s Addiction (aqui com Josh Klinghoffer na guitarra ao invés de Dave Navarro, que ainda estava se recuperando dos efeitos de uma infecção por COVID-19), Aurora, Hot Milk e outros de gringos; e Anavitória, Pedro Sampaio, O Grilo, Os Paralamas do Sucesso, Black Pantera, Ana Frango Elétrico, Black Alien, Gilsons, Tássia Reis e outros brazucas de respeito.
Lollapalooza Brasil 2024

O Lolla Brasil de 2024 finalmente teve o danado do show do Blink-182 depois de tanto tempo de espera e em estreia em solos latino-americanos. O Arcade Fire voltou depois de muito tempo ausente, o Kings Of Leon veio substituir o Paramore (que cancelou algum tempo depois que o cartaz apareceu) e depois de muito tempo vimos um artista brasileiro ser atração principal na figura do Titãs na “versão” Encontro com todos os membros vivos reunidos. De atrações principais ainda presenciamos Sam Smith, a estreia de SZA por aqui e Limp Bizkit para todos os homens adultos com mais de 35 anos que amam bermudas cargo. É estranhíssimo ver um cartaz desse e ver um artista na figura e calibre de Gilberto Gil não figurar entre os headliners, sendo que possivelmente faria isso em qualquer canto do planeta. Mas tudo bem. Ainda tivemos The Offspring, Phoenix, Hozier, Thirty Seconds to Mars, King Gizzard and the Lizard Wizard (finalmente!), Pierce the Veil, The Driver Era, Nothing But Thieves e tantos outros gringos. Os artistas brasileiros não ficaram para trás com Baianasystem, Marcelo D2, Céu, Day Limns, Tulipa Ruiz, Rancore, YMA, Supla e afins.
Lollapalooza Brasil 2025

E por fim chegamos na última e mais recente edição do Lolla em terras brasileiras. Tivemos a estreia tão aguardada de Olivia Rodrigo no Brasil, assim como foi a primeira vez do Tool por aqui, que já figurou nas atrações do Lollapalooza na gringa nos anos 90. Alanis Morissette, Justin Timberlake, Shawn Mendes e Rüfüs Du Sol finalizaram as principais atrações. Ainda tivemos o White Denim (que substituiu o Fontaines D.C que cancelou a participação no Lolla e festivais vizinhos por problemas de saúde de um dos membros), Foster the People, Parcels, Michael Kiwanuka, The Marías, Benson Boone, Tate McRae, Caribou, Inhaler, girl in red, JPEGMAFIA e mais uma galera. O Brasil estava representado em peso com Dead Fish, Sepultura em sua turnê de despedida, Terno Rei, Tagua Tagua, Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo, Marina Lima, Jão, Sofia Freire, PLUMA, Jovem Dionisio e mais uma galera de respeito.
Pronto, o primeiro exercício proposto nesse texto está feito. Olhar para esse histórico trás uma nostalgia envolvida, né? Ainda mais no meu caso em que eu vivi muito do Lolla no Brasil. O festival já é muito consolidado no calendário brasileiro de festivais e ao que tudo indica permanecerá assim por um bom tempo. Ainda assim é muito tranquilo dizer que tem algumas coisas que podemos falar sobre. O que nos leva ao próximo exercício desse texto: para onde o Lollapalooza em solo brasileiro vai? O que podemos pensar, reclamar, desejar para o futuro? É o que eu vou tentar responder diante de três perguntinhas.
Dá para se evitar o tanto de cancelamentos?
A lista é extensa. Paramore, Blink-182, Drake, Rina Sawayama, King Gizzard and the Wizard Lizard, Phoebe Bridgers, WILLOW, Jaden, Fontaines D.C, Snoop Dogg, Tyler the Creator, Jane’s Addiction, MARINA, 100 gecs, Omar Apollo, Dominic Fike…todos esses nomes já cancelaram na história do Lolla Brasil. Evitei citar todos eles lá em cima pra poder deixar essa lista a maior possível e ressaltar o quanto isso é meio que um enorme problema.
Como manter a confiança com o público e, principalmente, com o cliente? Não a toa, de alguns anos pra cá tem rolado um meme de “quem cancela dessa vez?” quando sai o line-up justamente porque espera-se que alguém cancele. E se é justo o artista ou banda que você quer tanto ver? Não é raro ver quem compra o ingresso antecipado só pelo rumor de que alguém está a caminho. Ou quem vai ao festival, pega a grade, passa o perrengue todo, só pra ver uma única pessoa. Como garantir que esse fã mais “hardcore” vai viver a experiência da vida dele se um cancelamento está sempre a espreita? Ainda mais sabendo que as pessoas pagam caro por um ingresso: um acesso para um único dia de festival na edição de 2025 passa dos mil reais para quem não tem desconto de meia-entrada ou benefícios de bancos patrocinadores.
Claro que aqui não entro no mérito de bandas que cancelam por motivos realmente urgentes, vide Foo Fighters em 2022 com a morte de Taylor Hawkins. É tenebroso, mas a morte sempre está aí nos esperando. Acontece. E também tem os casos em que alguns deles eventualmente voltaram em edições posteriores ao cancelamento, o que de alguma medida suaviza alguns cancelamentos. Mas é meio triste pensar que cada vez mais a chance de ter um artista cancelado por “motivos pessoais”, “conflitos de agenda” ou “imprevistos de última hora”. São os contratos? São as questões logísticas? Ou a falta de compromisso dos artistas? Dá pra resolver isso?
A “crise dos headliners” é real?
Ao se falar de música ao vivo, principalmente de festivais, um fenômeno que tem sido discutido é a “crise dos headliners”. De uma forma geral, dá para perceber que os eventos tem repetido atrações constantemente ou que poucos cartazes tem aquela sensação de trazer bandas e artistas que pouco vem ou que nunca vieram ao Brasil. Exemplos não faltam: no próprio Lolla Brasil 2025 tivemos Shawn Mendes e Alanis Morissette - ele veio em 2024 no Rock in Rio, ela veio no final de 2023 em um show solo no Allianz Parque em São Paulo também. Ainda que sejam artistas que tenham fãs dedicados e que lotaram seus respectivos dias de show, fica uma sensação de “acho que eu já vi isso antes”.
Esse fenômeno se dá por alguns motivos. O principal deles é financeiro: as grandes bandas e artistas preferem fazer shows solo em arenas e estádios ao redor do mundo porque é mais lucrativo. Ainda que os custos de produção sejam altos, eles acabam retendo maior parte dos lucros e da capacidade de fazer o espetáculo do seu jeito e seguindo seus conceitos próprios. Outro ponto é que há uma tendência de que os festivais preferem se vender como uma “experiência” do que como “espaço/momento para se ver música ao vivo”. Não a toa cada vez mais vemos setores VIP, VIP do VIP, fossos com celebridades e influenciadores digitais a pino que não se importam muito com quem estão vendo ali ao vivo…e as pessoas que preferem pegar brindes do que ver shows.
Aqui no Brasil ainda temos o fato de que três dos maiores festivais do país - Lollapalooza, The Town e Rock in Rio - são controlados pela mesma empresa, a Rock World; ela, por vez, tem participação majoritária da Live Nation, que é a maior produtora de turnês e festivais a nível global. Ou seja, temos uma tendência a cada vez mais os line-ups estarem um pouco mais homogêneos. O fato é: parece que a quantidade de artistas e bandas que são capazes de juntar um público em torno de oitenta mil pessoas aqui no Brasil e ao redor do mundo está cada vez menor.
Dá pra dizer que o Lolla ainda é um festival de música alternativa?
Essa resposta já é meio que respondida se você olhar com um pouco mais de carinho no histórico recente do Lollapalooza no Brasil e em outros países. Antes de chegar lá, talvez seja importante voltar um pouco. O que é música alternativa? Se você pesquisar pode encontrar várias definições, mas um consenso geral é de que música alternativa é caracterizada por canções que são mais ecléticas, ousadas e desafiadoras e que por isso não entram no “mainstream”. Comumente são divulgadas e lançadas por selos e gravadoras independentes e abraçam uma série de outros subgêneros, como o punk, post-punk, new wave, shoegaze, indie rock e por aí vai.
Logo, se você pegar artistas como Justin Timberlake e Shawn Mendes que figuraram no Lolla Brasil 2025, não dá para dizer que eles são alternativos. No Lolla Chicago, por exemplo, na edição que virá ao final de julho e início de agosto terá Luke Combs, um dos maiores fenômenos recentes do country norte-americano. No entanto, se você olhar ao redor do cartaz você consegue vislumbrar artistas e bandas que se conectam mais com o que chamamos de música alternativa nas linhas menores do cartaz. Se você olhar bem, dá pra encontrar Cage the Elephant, Fcukers, Wallows, Djo, Otoboke Beaver, Clairo, Doechii, Remi Wolf e tantos outros.

Então não, o Lollapalooza não é mais um festival de música alternativa há tempos, não só aqui como lá fora. E tá tudo bem. Talvez o festival tenha crescido tanto que é impossível manter ele ativo se você não abraçar artistas e bandas que sejam mais voltadas ao dito “mainstream” e a um apelo popular maior. O próprio festival no Brasil parece estar seguindo nessa direção; trazendo artistas que são gigantescos por si só, com carreiras consolidadas e que arrastam multidões, mas “atirando para todos os lados” tentando captar um publico que aparenta estar cada vez mais difuso e cético quanto à proposta do festival. Se você quiser festivais independentes alternativos “de verdade”, tem o Pitchfork London Festival lá fora, o Balaclava Fest aqui no Brasil, dentre vários rolês.
Acho que eu termino esse post com mais perguntas do que respostas bem estabelecidas. E isso é com um propósito: provocar uma troca de ideias com você que está lendo esse texto. Você já esteve no Lolla Brasil? Se sim, em quais edições? Você acha que o Lolla no Brasil vai seguir sustentável no futuro? Cada vez mais teremos mais atrações “mainstream” do que música “alternativa”? Os cancelamentos foram coisa do momento ou eles vieram para ficar nessa tendência das turnês mundiais? Quem você gostaria de ver no Lolla nas próximas edições? Sei lá, vai que alguém da produção do Lolla cai aqui e vê o que vocês tem a dizer. Comente aí embaixo ou manda um email no batidacronica@substack.com que eu vou ter o maior prazer em te responder.
Caso você não tenha visto a edição bônus anterior (que vou deixar aqui discretamente), estou pensando em montar uma edição piloto de um “clube de audição de álbuns”, por falta de termo melhor. A intenção é juntar uma galera online, ouvir um disco, trocar uma ideia e fazer amizades. Isso te interessa? Comenta aqui embaixo ou me manda uma mensagem no batidacronica@substack.com que a gente se fala.
Se inscreva, compartilha, curta e faça o que quiser com o batida crônica. Até o próximo post! :)
preciso da história de como você foi pro lolla patrocinado pela doritos
Acho que nunca mais vou ver uma edição de Lolla como foi 2016!!!! Meu eu que se descobriu fã de Alabama Shakes chora com a experiência até hoje.
(A partir daqui eu me senti uma tia chata escrevendo, perdão!)
Creio que o formato do festival se torna cada vez mais in$ustentavel. Preços exorbitantes e lines que cada vez mais não me chamam atenção, mas até aí, é um recorte geracional.
É importante reconhecer que o Lolla é o lugar de uma galera mais jovem e quem tá na casinha dos 30 não vê mais tantas atrações quanto há 10 anos atrás.
Torço para que o festival continue existindo e tenha alguma reformulação para trazer aquele mix gostoso de bandinhas que a galera vai conhecer e AMAR, as que a galera já conhece e ama e as icônicas!!!!!
O nome Lollapalooza tem tudo pra continuar existindo na América do Sul e eu espero que meu filho possa viver a maravilhosa experiência de subir pra Interlagos, sentir a batata da perna queimando na ladeira, o frisson de passar a fila e finalmente curtir vários shows na companhia dos amigos! (E dos pais).